Voz de Augusto Martins se harmoniza com o violão de Hélio Delmiro no canto de ‘Certas coisas’ em álbum de duo
30/05/2025
(Foto: Reprodução) Capa do álbum ‘Certas coisas’, de Augusto Martins e Hélio Delmiro
Divulgação
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Certas coisas
Artista: Augusto Martins e Hélio Delmiro
Cotação: ★ ★ ★ 1/2
♬ Em 1974, quando César Camargo Mariano produziu o álbum Elis & Tom no MGM Studios em Los Angeles (EUA), o guitarrista Hélio Delmiro foi um dos músicos arregimentados por Mariano para tocarem no disco gravado de 22 de fevereiro a 9 de março daquele ano de 1974. É de Delmiro, por exemplo, a guitarra ouvida em Fotografia (Antonio Carlos Jobim, 1979) nesse disco antológico que uniu Antonio Carlos Jobim (1927 – 1994) e Elis Regina (1945 – 1982).
Dai ser sintomático que Fotografia esteja na abertura de Certas coisas, álbum lançado hoje, 30 de maio, pelo cantor Augusto Martins com Hélio Delmiro, que se alterna nos toques dos violões e das guitarras de 12 músicas colhidas no cancioneiro brasileiro e internacional.
Sim, são 12 músicas em quatro idiomas diferentes, sendo que uma, Acanhado, parceria de Moacyr Luz com Delmiro, é inédita (em que pese o ar vintage de tema da era pré-bossa nova) e ganha o primeiro registro fonográfico oficial no álbum do duo.
Sim, a rigor, Certas coisas é disco de duo. Um disco mais de voz e violão do que de voz e guitarra. A guitarra está somente no bolero Contigo aprendi (Armando Manzanero, 1967), na canção francesa Jardin d’hiver (Benjamin Biolay e Keren Ann Zeidel, 2000) – apresentada ao mundo há 25 anos na voz macia de Henri Salvador (1917 – 2008) – e em Se alguém telefonar (Alcyr Pires Vermelho e Jair Amorim, 1957), samba-canção conhecido em vozes sentimentais como as de Lana Bittencourt (1932 – 2003) e Carlos José (1934 – 2020).
Violonista referencial no universo do jazz brasileiro, Hélio Delmiro é músico que refina qualquer gravação com toque límpido, preciso, não raro inventivo. Augusto Martins é cantor afinado que entende do ofício, mas por vezes soa no álbum Certas coisas sem o brilho de intérprete que ficou mais evidenciado em discos anteriores.
O canto ligeiramente apressado da música-título Certas coisas (Lulu Santos e Nelson Motta, 1984), por exemplo, desestabiliza a sinfonia de silêncio e sons dessa canção lançada por Lulu. Da mesma forma, parece inexistir sentimento no canto meramente correto, em castelhano, de Contigo aprendi – e, em se tratando de bolero, isso é fatal.
Emoção à parte, o duo resulta extremamente harmonioso e refinado em Como vai você (Antonio Marcos e Mario Marcos, 1972), balada angustiada que Roberto Carlos – cantor hábil na conciliação de técnica e sentimento – lançou há 53 anos.
Gravado ao longo de 2023 no Vale da Tijuca, estúdio mantido por Augusto Martins na casa em que vive na cidade do Rio de Janeiro (RJ), o álbum alinha registros competentes de músicas como Fé cega, faca amolada (Milton Nascimento e Fernando Brant, 1974) e Sinal fechado (Paulinho da Viola, 1969), esta talvez o momento em que o cantor mais consiga irmanar a técnica com o sentimento da letra.
De todo modo, o segredo para a fruição do disco é esquecer as comparações com gravações prévias de standards como All the way (Jimmy Van Heusen e Sammy Cahn, 1957).
Fora de cena de cena desde junho de 2024, por problemas de saúde, Hélio Delmiro está em tratamento, sem poder estar no palco quando Augusto Martins estrear o show calcado no disco. Virtuose do violão, Marcel Powell assumirá o posto do colega no show. Já o álbum Certas coisas fica para a posteridade como mais um atestado da maestria de Hélio Delmiro.